Resenha - Por uma Igreja do Reino - Adriano Sella

Resenha – Por uma Igreja do Reino – Adriano Sella

 

                                                                                                                                             Romulo Freire

Em razão da necessidade da Igreja de buscar as mudanças em vista dos apelos da humanidade e às exigências do Evangelho de Jesus Cristo, é preciso pensar os novos estilos de vida pastoral e eclesial, assumindo modos novos de ser Igreja hoje.

Em relação a missa, o quanto é importante o cuidado em preparar e realizar as celebrações eucarísticas, para não cair em rituais vazios e estéreis que apenas tranquilizam a consciência, porque cumpriu o dever de católico. A missa seja um momento forte e cheio de vitalidade divina, em que Cristo não seja somente recordado, mas torne presente com a Eucaristia, ápice do encontro com Cristo gerando mudança de vida, deixando um sinal indelével na vida das pessoas e da comunidade.

No encontro com Deus e com o próximo, a transparência na comunicação é necessária, seja para os religiosos como para os leigos, pois percebe-se que existe situações de omissão por conta do medo de perder benefícios pessoais, visando o carreirismo como tentativa de chegar “em cima”, de alcançar uma posição por meio da Igreja. A solução é pedir a Deus o dom da liberdade de ação e de palavra, transparência para eliminar todo o medo e recuperar a coragem de agir no que acreditamos, dizendo a verdade por via da graça e sendo livres, por uma visão própria não condicionada pelos outros e de viver a própria fé, mesmo quando não se é compreendido e passando-se pelo sofrimento.

A transparência torna-se um fator importante na evangelização com o ensinamento que se dá pelo testemunho, pois este modo será incisivo na vida de uma pessoa, que adere ao discipulado pelo amestramento evangélico que é a vida sintonizada com o anúncio da Palavra. O mundo está cheio de mestres, verdadeiros ou falsos, mas tem carência de testemunhas que falam com a vida. As palavras da testemunha são carregadas de vida e têm um peso enorme, porque chegam com um tal calor humano que se tornam uma chave que abre todas as consciências, dando a possibilidade de instalar-se no mais profundo do coração.

Para ser testemunha, é preciso oração que exige silêncio, escuta profunda que se torna contemplação não somente por ausência de palavras, mas ausência de pensamentos na mente que está a vagar, nos colocamos aos pés de Deus para ouvi-lo, conseguimos ir além da aparência para encontrar-nos com o seu grande mistério. Buscar Deus no silêncio, por uma ponte suspensa lançada pela alma enamorada de Deus sobre o abismo tenebroso do próprio espírito, é entrar no deserto silencioso que é santo e é uma oração que conduz a presença contínua de Deus e às alturas da contemplação, onde a alma pacificada, vive da vontade daquele que ela ama totalmente, absolutamente, continuamente.

É preciso o silêncio orante e contemplativo, para o contato com Deus é a sua Palavra por meio da Bíblia, não só o livro da Igreja, mas de nossa casa. A verdadeira escuta das Escrituras deve suscitar em nós um itinerário espiritual que conduza à conversão pessoal e eclesial e a mudança do nosso modo de viver, convencendo-se de que a Bíblia fala ao coração do homem e solicita profundas mudanças em nosso comportamento. É preciso “Escolas da Palavra, de leitura e escuta da Bíblia, de contemplação e de partilha”, atualizando a Lectio Divina, inventando novos espaços e novas formas de aproximar os fiéis da Palavra de Deus.

Sem o amor a Palavra e o silêncio orante, as celebrações podem ser impecáveis na formalidade litúrgica, todavia trata-se da forma e não da substância litúrgica. Quando a forma não consegue manifestar a substância, então torna-se um ritual vazio ainda que belo, sem profundidade de vida divina, colocando a aparência como forte cultura da estética mais que o ser, não valorizando tanto o conteúdo mas a embalagem. A celebração trata-se de um encontro com o Deus vivo, fazer uma experiência forte e saborear o encontro com Cristo Ressuscitado portador de novidade e de mudança. O sacerdote deve ter uma relação, parar um pouco antes da missa em oração, evidenciando a relação com Deus.

O modo de relação com Deus traduz o modo de relação com as pessoas, quando se trata das visitas de um sacerdote aos seus fiéis, tornando importante uma visita pela presença de qualidade, de modo que o visitado sinta o calor da relação humana e a proximidade do Deus conosco. É a qualidade da presença que converte e modifica as pessoas, não tanto a frequência. O que impressiona o povo é uma presença dada com o coração, ao passo que a apressada marca pouco no nível humano e religioso, uma presença que exprime não só a proximidade da pessoa mas também toda a sua existência, visando a acolhida do outro determinada pelo amor, a escuta recíproca e a gratuidade em estar pelo valor da relação.

O convívio pelas relações ajuda a ir além da aparência para podermos conhecer o mistério que está escondido em cada ser humano, pois conhecer o ambiente social e familiar da pessoa, nos conduz a entender o seu modo de viver e comportar-se. A convivência nos permite ir ao coração de cada um e não se deter na superficialidade, descobrindo quanto amor existe na particularidade do outro que pode ser considerado um pecador segundo os critérios humanos, mas não segundo o querer de Deus e quantas potencialidades estão escondidas naquela pessoa, que poderiam superar largamente as suas fragilidades, se fosse libertada das correntes que a impedem de caminhar.

O pároco é o homem da comunhão, da relação e por isso terá o cuidado de promover vocações, ministérios e carismas. A sua paixão será fazer os carismas passar da colaboração à responsabilidade, de figuras que dão uma mão a presenças que pensam juntas, caminham dentro de um projeto pastoral comum em que os leigos se tornem cristãos adultos pela maturidade da fé. O seu ministério específico de guia da comunidade paroquial deve ser exercido tecendo a trama das missões e dos serviços: não é possível ser paróquia missionária sozinhos.

Com os desafios contemporâneos para o anúncio do Reino de Deus, os padres são chamados ao aprofundamento e a meditação dos estudos, mesmo após concluir o período do seminário, com a contemplação da Palavra de Deus, para poder ver em profundidade, na história e nos problemas de hoje, além da aparência que nos bloqueia num nível formal, e encontrar assim a substância que é a essência da vida. Tornar-se um contemplativo de Deus que significa tornar-se apaixonado por Deus, senti-lo dentro e profundamente, enamorado da vida pascal que não faz outra coisa senão falar da pessoa amada, com paixão, com palavras ardentes que são sentidas, cheias de ternura, tornando presente Deus e fazendo os outros encontrá-lo, aquecendo o coração gerando vida em abundância. Percebê-lo hoje na nossa vida cotidiana, ir além do visível do formal ou do previsível para saber colher a essência do cristianismo e transmiti-la hoje.

Para atingir as pessoas e conduzi-las ao essencial, é preciso transmitir a via mestra de Jesus que é o discipulado como caminho para poder conhecer o grande mistério de Deus e esta abordagem tem sido recuperada pela teologia mística ou espiritual contemporânea mediante a scientia experimentalis. A teologia espiritual privilegia a categoria da “experiência”, em que o homem é redimido fazendo a experiência do amor de Deus, conhece um momento de redenção que dá um sentido novo a sua vida, caminho para entrar no dinamismo do Espírito de Deus, como método para sermos guiados e agirmos segundo a vontade de Deus.

Guiados pelo Espírito de Deus, o cristianismo nos impregna de esperança, de dinamismo fundamental que guia o fiel a viver segundo os valores do Evangelho, o movente principal que nos conduz a viver a fé, a esperança de sermos amados por Deus, compreendidos, perdoados, aceitos do jeito que somos e acolhidos para viver uma vida plena. A esperança tem a paixão do visionário, dá a capacidade de construir o futuro, não o aguarda apenas; concede a garra do lutador, não a resignação de quem entrega as armas; muda a história, não se deixa vencer por ela; não faz somente o mínimo, mas mira o alto, para atingir o máximo de uma vida plena ou em abundância de sabor e de beleza; saindo dos próprios recintos e abrindo-se para encontrar o outro (como irmão, companheiro e amigo) até alcançar o Deus conosco e chegar a uma vida rica de sentido, gosto e felicidade.

Na dimensão do encontro com os últimos e com aqueles que Deus quer, o tornar-se profeta segundo o desígnio de Deus, significa ter visão ampla para entrever o futuro captando como Deus age na história e percebendo quais são os percursos contemporâneos para realizar o seu Reino, vai além da aparência e do que é previsível, que vai além das imagens que fizemos sobre Deus e que sabe apreender o contínuo devir de Deus na história. O agir na dimensão da profecia é encarnar a coragem de denunciar o mal e de desvendar como ele se manifesta hoje, mas também a força de anunciar o novo que vem e que se encarna no meio da humanidade fazendo crescer o Reino de Deus.

Essa mesma humanidade que necessita ser recuperada pelo anúncio do novo, em que a pessoa é reconhecida em todo o seu tecido humano que vai da superfície à profundeza do coração e da mente. Este profundo conhecimento da pessoa nos levará a perceber quais são os ritmos de um crescimento autêntico e livre, perceber os mecanismos psicológicos de condicionamento e de coação que são atuados hoje; a perscrutar quais são as situações pecaminosas que passam de geração em geração, quais as causas que conduzem a certos pecados, a investigar as raízes do mal que penetram na vida das pessoas e descobrindo, poder agir para removê-las. Descobrir os itinerários educativos que levam as pessoas a caminhar, superar os problemas, atingir por etapas as metas da vida cristã e assim gerar processos virtuosos.

É preciso apontar o caminho para as pessoas que não o conhecem, por meio da missionariedade que deriva do olhar dirigido ao centro da fé na pessoa de Jesus Cristo, não com o objetivo de trazer as pessoas para a Igreja, mas conduzi-las ao Ressuscitado, não aguardando as pessoas na Igreja, mas ir até os outros, procurando entrar no mundo e transformá-lo com a força do Evangelho. A exigência da missionariedade é passar de uma Igreja estática e perfeita, para uma Igreja dinâmica e sempre a caminho para encontrar o povo. A Igreja está em missão, porque é próprio da natureza da Igreja ser missão, assim como está na natureza de Deus revelada a nós pela encarnação, um Deus conhecido e amado pela humanidade porque saindo do paraíso e vindo para o nosso meio, se fez missionário. A preocupação está em permitir aos fiéis de fazer uma profunda e verdadeira experiência do Cristo Ressuscitado, encontro apaixonante e salvífico entre Deus e a humanidade, de modo a tornar as pessoas capazes de abraçar novos estilos de vida, vivendo a fé em profundidade onde quer que se encontrem.

Jesus de Nazaré possuía a arte de extrair o melhor de cada pessoa, o bem que está escondido no mistério humano e que muitas vezes está aprisionado por mecanismos e sistemas dominados pelo mal, não olhando tanto os seus limites, fragilidades e incompetências, mas valoriza os seus talentos, dons e capacidades.

O nosso “sim por uma Igreja do Reino”, conduz-nos a olhar para o alto e para entrevermos a grande meta de uma vida verdadeira e profunda, que nos permitam valorizar o melhor de cada um, fazendo emergir o tesouro escondido no mistério de cada pessoa e valorizando os muitos talentos e dons concedidos por nosso Deus à sua Igreja!

 

 


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