Artigo - Igreja e Sociedade
IGREJA
E SOCIEDADE: CELAM COMO RESPOSTA AO “AGGIORNAMENTO” NA AMERICA LATINA
Victor
Benincasa Borejo
RESUMO
A Igreja Católica Apostólica
Romana, é uma instituição religiosa que sempre procurou dialogar com a época
que está inserida. Por ser uma instituição antiga teve de passar por muitas
modificações nesse modo de relacionar-se com a sociedade, conforme as épocas.
Parte disso é o que acontece no Concílio Vaticano II, que procura atualizar o
diálogo da Igreja com o mundo moderno. Em resposta a essas mudanças a igreja
latino-americana fez ecoar as recomendações do concílio trazendo novas luzes
para o diálogo com a sociedade.
Palavras
Chaves: Igreja e Sociedade, Concílio Vaticano II, CELAM, igreja
latino-americana.
INTRODUÇÃO
A Igreja Católica desde seus
primórdios é um ente que se relaciona com a sociedade. Tal relação já passou de
bem conturbada, quando era perseguida e rechaçada; para quando a sociedade era
baseada nos princípios na cristandade da Idade Média e até hoje, atualmente em
que, baseada no Concílio Vaticano II, a Igreja procura manter diálogo com o
atual mundo contemporâneo.
Por isso, analisando a
história vemos uma Igreja, que desde o século XIX, quando acontece a
modernidade e suas revoluções, fica isolada do mundo moderno, é então que se
convoca o Vaticano II que propõe e coloca a Igreja em diálogo com a modernidade
trazendo um “Aggiornamento” atualização na maneira de se relacionar com
o mundo e a sociedade, sem alterar a sua essência, como afirma o concílio:
O sagrado Concílio propõe-se fomentar a vida
cristã entre os fiéis, adaptar melhor às necessidades do nosso tempo as
instituições susceptíveis de mudança, promover tudo o que pode ajudar à união
de todos os crentes em Cristo, e fortalecer o que pode contribuir para chamar a
todos ao seio da Igreja...[1]
Grandes são as novidades
trazidas nessa nova forma de se dialogar, que demoraram e ainda demoram a serem
totalmente implementadas. Porem, os bispos latino americanos ao escutarem as
mudanças quiseram fazer ecoar os novos ensinamentos na Igreja e se reuniram
diversas vezes para colocarem em prática essa nova forma de ser Igreja.
Até o presente momento foram
realizados cinco encontros para traduzir aquilo que queria o Vaticano II, para
os moldes da igreja da América Latina, no quesito diálogo com a sociedade, são
elas: Rio de Janeiro em 1955, Medellín em 1968, Puebla em 1979, Santo Domingo
em 1992 e Aparecida em 2007 (todas elas geraram um documento).
A
Conferência do Rio de Janeiro e seu Diálogo com a Sociedade
O tema que permeia toda essa
Conferência é a: evangelização como defesa da fé e das vocações e a preparação
do clero, o seu primeiro ato, fora criar o CELAM, em seguida discutir alguns
temas referentes ao clero, aos anticatólicos e as atividades sociais católicas.
É uma conferência que marca e traça a cara da Igreja na américa-latina, embora
ela tenha sido convocada antes do início do Vaticano II, ela já dá passos
largos em direção ao que futuramente iria propor o concílio.
O principal fato, que marca o
diálogo dessa conferência com a sociedade é destacado logo no preâmbulo do
documento gerado pela conferência: “foram examinadas atentamente a situação
religiosa de cada um dos países da América Latina”[2]. Dessa forma:
Revela-se
a preocupação com “as deficiências e dificuldades que nascem dos peculiares
problemas religiosos de nossas Nações e as que provêm dos movimentos
anticatólicos que tendem a intensificar-se neles” como também “o angustiante
problema, sobretudo, da escassez de ambos os cleros em todos os países do
Continente”[3].
A Igreja nesse sentido
primeiro olha para a realidade em que está inserida e ali, observando a si
mesma vê e enxerga a necessidade de que os clérigos sejam os primeiros a se
readequarem ao diálogo com a sociedade atual e moderna. Por isso, aborda
superficialmente os temas sociais. Porém não se deixa de valorizar os leigos,
que são agentes tão importantes, inseridos na sociedade (militantes) que podem
auxiliar no diálogo da Igreja com a sociedade atual.
Quanto ao âmbito social faz
várias denúncias as várias desigualdades presentes no continente
latino-americano, tais como as situações deploráveis de trabalho, e a condição
desigual no âmbito material. Tais pontos já indicam de fato, uma mudança de
olhar e ação quanto a Igreja inserida na sociedade.
A
Conferência de Medellín e seu Diálogo com a Sociedade
Por sua vez, a conferência de
Medellín, acontece um ano após o término do Concílio. Ela é um grande marco na
Igreja da América-latina, pois como diz o próprio documento: “Nossa reflexão
orientou-se para a busca de formas de presença mais intensa e renovada da
Igreja na atual transformação da América Latina”[4].
Portanto, é uma conferência
que leva em conta os documentos do concílio para elaborar uma grande reflexão
de como será a resposta inicial da Igreja na América-latina para ele. Dessa
forma, os temas tratados são: a Promoção humana; Evangelização e crescimento na
fé; Igreja visível e suas estruturas.
Dessa forma, é uma conferência
que parte da analise da sociedade baseado no método: ver, julgar e agir, para
que possa encontrar a melhor forma de trazer a atualização do Vaticano II para
a Igreja da América-latina, levando-a a um melhor dialogo com a sociedade e
tudo aquilo que lhe permeia, por isso afirma:
Queremos
que a Igreja da América Latina seja evangelizadora e solidária com os pobres,
testemunha do valor dos bens do Reino e humilde servidora de todos os homens de
nossos povos”. [...] O mandato particular do Senhor que prevê evangelização dos
pobres deve levar-nos a uma distribuição tal dos esforços e do pessoal
apostólico que deve visar, preferencialmente os setores mais pobres e
necessitados[5]
O fato importante a se citar
quanto ao diálogo com a sociedade, referente a Medellín são as Comunidades
Eclesiais de Base (CEBs):
Nada
marcou mais a Igreja latino-americana como a formação, organização das
comunidades eclesiais de base (CEBs). A importância da ação das CEBs se
verifica na união entre fé e vida buscando na opção de fé os princípios e
valores que é preciso defender para que se estabeleça a justiça na sociedade e,
os pobres tenham seus direitos respeitados.[6]
Elas foram as responsáveis por
dar a voz necessária para o povo dialogar com a sociedade e a Igreja, fazendo
acontecer a justiça e a unidade. Fazendo nascer uma nova teologia, baseada no
pobre e necessitado, fazendo com que o homem olhe para o irmão e enxergue nele
o Cristo que perece, que tanto nos fala o evangelho.
A
Conferência de Puebla e seu Diálogo com a Sociedade
A conferência de Puebla tem
como tema a evangelização no presente e no futuro na América Latina, tendo como
plano de fundo a exortação apostólica Evangellii Nuntiandi, do Papa
Paulo VI. É a partir do método ver, julgar e agir, analisar a evangelização já
feita e pensar seu futuro quando se trata da América-latina, por isso:
Se
requer de Puebla, uma Igreja que testemunha, proclama, celebra e atua o
Evangelho com justiça, amor, pobreza, uma Igreja num processo dinâmico e
permanente de evangelização, de tal forma que todo o cultural, o político, o
econômico, o social, seja lido e discernido a partir do Evangelho. Vale a pena
mencionar que, conforme Puebla, os setores mais necessitados de evangelização
foram: A família (em especial a mulher), a juventude, os camponeses, o mundo
operário, os afro-americanos, os meios de comunicação social.[7]
Para ajudar em todo esse
processo, da Igreja que se insere na comunidade, destaca-se, assim como em
Medellín a figura das CEBs, que são muito importantes para a integração entre
Igreja e sociedade, trazendo assim novas formas de evangelização e diálogo.
Observa-se dessa forma, que
Puebla não é uma negação de Medellín, mas sim sua continuação, pois quer
mostrar para a sociedade com quem agora dialoga que a Igreja é
“Igreja-sacramento de comunhão” que valoriza aquele que deve ser valorizado,
trazendo a justiça e a paz para os oprimidos. Mostrando os verdadeiros
ensinamentos de Cristo. Uma Igreja que ajuda a construir uma sociedade melhor,
denunciando o pecado e chamando a conversão.
A
Conferência de Santo Domingo e seu Diálogo com a Sociedade
A conferência de Santo Domingo
é marcada por dar continuidade ao que já fora iniciado em Medellín e Puebla.
Portanto, buscava-se uma nova maneira de se alcançar o ser humano, com a nova
Evangelização, por meio da missão, ressaltando a figura do pobre e daquele que
passa necessidade.
Foi em Santo Domingo que
algumas dessas afirmações se tornaram mais formais, reafirmando a doutrina da
Igreja e aquilo que era fundamental da fé, trocado o até então “ver, julgar e
agir” por iluminação teológica, desafios pastorais e linhas pastorais. Sempre
ressaltando a doutrina e a vida que se vivia. Pode-se concluir assim que:
Santo
Domingo, o encontro da Nova Evangelização com a Igreja Latino Americana e
Caribenha, contendo os instrumentais de uma postura crítica à uma caminhada
própria de uma Igreja fonte, porém com espaço suficiente para que permaneça na
Igreja o que vem de Deus. Essa é a configuração exatamente anterior à
Aparecida, onde esta, agora servirá de conclusão de um longo processo de
avaliação crítica da Igreja Latino Americana e da Nova Evangelização,
aprofundando o processo de interação eclesiológica e missiológica na América
Latina e Caribe.[8]
A
Conferência de Aparecida e seu Diálogo com a Sociedade
Por fim, a mais recente conferência
realizada pelo CELAM, busca ainda mais fortemente reunir forças para realizar
tudo aquilo que já fora dito no Vaticano II e ecoado nas demais conferências.
Por isso em Aparecida:
A
Igreja é convidada a resgatar a sua essência, a missão, tendo como modelo as
primeiras comunidades cristãs, formando seus presbíteros, consagrados,
consagradas, leigos, com renovado ardor missionário, superando os desafios da
sociedade hodierna, vivendo os sacramentos, sobretudo alimentando-se na
Eucaristia, sustento na caminhada, pois “esta firme decisão missionária deve
impregnar todas as estruturas eclesiais e todos os planos de pastorais de
dioceses, paróquias, comunidades religiosas, movimentos e de qualquer
instituição da Igreja”.[9]
Trata-se de um animar
missionário para os missionários, chamando para evangelizar e trazer ao mundo a
alegria de viver com Cristo, servindo ao próximo, olhando para aquele que sofre
e é oprimido, valorizando assim, o ser humano com toda a sua dignidade.
CONCLUSÃO
Urge que, o Concílio Vaticano
II trouxe novos ares para a Igreja, em todos os sentidos e âmbitos,
principalmente no que concerne no diálogo com a atual sociedade. Em vista
disso, o CELAM procurou ecoar tais ensinamentos na vida da Igreja da América-latina
meditando em 5 encontros as medidas que deveriam ser adotadas para que a Igreja
se renovasse.
Desses encontros, inspirados
divinamente, a Igreja se renovou e trouxe para o diálogo e a inclusão aquele
que sofre, pobre, afastado, para a libertação e a salvação dada por Cristo.
Trata-se de um colocar a Igreja a serviço do Cristo que sofre que é nosso
irmão. Agora a Igreja em dialogo valoriza ainda mais o ser humano que é a
Imagem e Semelhança com Deus, esse é o verdadeiro espírito que brota do CELAM e
do Vaticano II.
BIBLIOGRAFIA
Constituição
Sacrosanctum Concilium. In Documentos do Concílio Vaticano II:
constituições, decretos, declarações. Petrópolis: Vozes, 1966.
DOCUMENTO
DE APARECIDA. Texto conclusivo da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano
e do Caribe. São Paulo: Paulus, 2007.
MEDELLÍN
(Texto Oficial): Conclusões da Conferência de Medellín, 1968. Edição
revisada, atualizada e traduzida da edição oficial em espanhol por Fr. Manuel
Jesús R. Blanco. São Paulo, Paulinas, 1998.
NEY,
Souza de. Do Rio de Janeiro (1955) à Aparecida (2007): Um Olhar sobre as
Conferências do Episcopado da América Latina e Caribe, Revista de Cultura
Teologica. São Paulo, v. 16 – N 64, Julho – Setembro. 2008. Disponível em: <https://revistas.pucsp.br/index.php/culturateo/article/viewFile/15533/11599>.
Acesso em 22 mai. 2020.
PUEBLA
(Texto oficial da CNBB): A Evangelização no Presente e no futuro da América
Latina, Petrópolis, Vozes, 1982.
SANTO
DOMINGO (Texto oficial): Conclusões da IV Conferência do Episcopado Latino-Americano,
São Paulo, Paulinas, 1992.
[1] Constituição Sacrosanctum Concilium. In
Documentos do Concílio Vaticano II: constituições, decretos, declarações.
Petrópolis: Vozes, 1966. Nº1
[2] NEY,
Souza de. Do Rio de Janeiro (1955) à Aparecida (2007): Um Olhar sobre as
Conferências do Episcopado da América Latina e Caribe. Revista de Cultura
Teológica, São Paulo, v. 16 – N 64 p. 131
[4]
MEDELLÍN (Texto Oficial):
Conclusões da Conferência de Medellín, 1968. Edição revisada, atualizada e
traduzida da edição oficial em espanhol por Fr. Manuel Jesús R. Blanco. São
Paulo, Paulinas, 1998. p.2
[6] NEY, Souza de. Do Rio de Janeiro (1955)
à Aparecida (2007): Um Olhar sobre as Conferências do Episcopado da América
Latina e Caribe. Revista de Cultura Teológica, São Paulo, v. 16 – N 64p. 134
[9]
Ibid p. 143
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